Posicionamento Político das organizações sociais da América Latina e do Caribe para o COP 21
Topics
Novembro 2015
Os signatários, organizações e movimentos sociais na América Latina e no Caribe:
CONSIDERAMOS
Que a crise atual não se trata apenas do aquecimento global. É também uma crise socioeconômica, política, alimentar, energética e ecológica. Em suma, uma crise sistêmica cujos efeitos são visíveis globalmente. Esta crise tem suas raízes no sistema capitalista que por sua vez é baseado em um modelo de produção e consumo extrativista, predador dos bens comuns e de força de trabalho, criado em função de favorecer os interesses das grandes corporações transnacionais.
Entre os efeitos da crise, vemos um aumento na discriminação e violência, em particular, contra as mulheres, migrações forçadas, a perda de soberania sobre o patrimônio natural e da incapacidade de continuar a existir como comunidades originárias e de viver em harmonia com a Mãe Terra. Enquanto os impactos da crise climática são evidentes a nível mundial, é no Sul global onde essas consequências estão se manifestando de forma aguda através de eventos climáticos extremos, deslizamentos de terra, degelos, inundações, secas, entre outros eventos.
Para enfrentar esta crise, acreditamos que é necessária uma mudança de sistema, que modifique radicalmente nossos padrões de produção e consumo, e que tenha por objetivo proteger o meio ambiente, como uma maneira de viabilizar a sustentabilidade da vida.
DENUNCIAMOS E REJEITAMOS
1. Que o processo multilateral das negociações sobre o clima, no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (UNFCCC), tem levado cada vez mais à privatização, mercantilização e financeirização da natureza e dos bens comuns, negligenciando as verdadeiras causas estruturais da mudança climática. Além disso, nas tratativas os estados desenvolvidos conseguiram se livrar de suas obrigações e responsabilidades históricas para a crise climática. Atualmente existe uma negociação baseada em promessas de redução de emissões e que implicaria a todos os Estados membros da Convenção
2. A captura corporativa da Convenção do Clima, que deve ser urgentemente combatida como uma forma também de proteger o multilateralismo. Somos defensores deste multilateralismo que é crucial para que todos os países possam participar nas negociações e assim os países em desenvolvimento, possam reivindicar suas posições. Contudo, é necessário continuar alertando a captura corporativa da UNFCCC e luta para erradicá-la.
3. A aceleração dos processos de privatização, mercantilização e financeirização da natureza como parte das estratégias utilizadas pelas empresas, com base nos princípios da economia verde, que são nada mais que falsas soluções para a crise climática. Estas soluções falsas por sua vez intensificam a apropriação de terras e territórios e aprofundar a violação dos direitos das comunidades locais. Portanto, reafirmamos na Conferência Latino-Americana sobre Financeirização da Natureza, que realizamos em agosto deste ano em Belém do Pará, Brasil, muitas das organizações e movimentos sociais signatários.
4. As soluções falsas que estão sendo promovidas e aprofundadas para o possível Acordo de Paris. Algumas delas são: mercados de carbono, projetos de Redução de Emissões decorrentes do Desmatamento e da Degradação de florestas (REDD), alimentos transgênicos, agrocombustíveis, megaprojetos hidrelétricos, centrais nucleares, fraturamento hidráulico ("fracking"), agricultura climaticamente inteligente, manipulação em grande escala dos sistemas da Terra (Geoengenharia), Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade (TEEB).
5. Às grandes empresas, instituições financeiras internacionais, agências de desenvolvimento, entre outros agentes, em cumplicidade com muitos governos, promovem quadros institucionais para avançar ainda mais na comercialização e despojo de nossos territórios. Dessa forma, novos direitos são concedidos a grandes empresas transnacionais sobre até mesmo à soberania de nossos povos. Esta arquitetura de impunidade é expressa nos Tratados de Livre Comércio (TLC), tratados bilaterais de investimento (TBI), a Parceria Trans-Pacífico (TPP), o Acordo sobre o Comércio de Serviços (TISA), o Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) e todos aqueles que violam a soberania e autodeterminação dos povos. Apoiamos o processo de negociação no âmbito do "Grupo de Trabalho Intergovernamental de composição aberta sobre as empresas transnacionais e outras empresas em relação aos direitos humanos", criado pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU para estabelecer um tratado legal que obrigue as empresas transnacionais a respeitar os direitos humanos. Seguiremos vigilantes e ativos nas negociações deste Grupo de Trabalho.
6. O modelo de dominação e opressão que sustenta à dívida, onde através do pagamento dos serviços da dívida externa e interna continua a desviar os já limitados recursos existentes para o investimento social. Os recursos desviados poderiam ser usados para lidar com as consequências das alterações climáticas sobre a vida dos nossos povos. Falamos de uma dívida econômica, mas também climática, social e ecológica.
EXIGIMOS
No caminho para construir soluções reais para a crise, é urgente:
1. Que os países desenvolvidos se comprometam com a redução de emissões drásticas com base na sua responsabilidade histórica e capacidades respectivas, a transferir fundos para adaptação e atenuação da mudança climática no Sul global e a transferência de tecnologias.
2. Pôr fim aos processos de perseguição, desaparecimentos, torturas e assassinatos de ativistas sociais e defensores dos direitos dos povos e da Mãe Terra, ordenados por corporações na América Latina e em diversas partes do mundo. Além disso, parar com a repressão e criminalização do protesto social por parte de muitos governos.
3. A incorporação e o reconhecimento de alternativas para o Bom Viver, a sustentabilidade da vida, a defesa dos bens comuns e da Mãe Terra. Neste sentido, reivindicamos os estilos de vida dos povos indígenas e camponeses e sua visão do mundo em harmonia absoluta com a natureza, com base em princípios de justiça ambiental, social e climática.
4. Que se promova a autodeterminação territorial e o autogoverno, a soberania alimentar, uma mudança global da matriz energética que conduza à transição dos combustíveis fósseis e, no lugar, a soberania energética, a economia solidaria e feminista, a gestão comunitária de florestas, de terras e de água. Isto faz parte do pacote de medidas corretivas reais que consideramos urgentes para combater a crise sistêmica.
5. A mudança de sistema deve envolver uma transição justa, que será construída com os trabalhadores e trabalhadoras e a sociedade como um todo. Esta transição acontece também para garantir o emprego decente, a liberdade de organização, a garantia dos direitos fundamentais, tais como a negociação coletiva, greves, acesso à saúde, o diálogo social, os mecanismos que garantem a requalificação profissional. Também através da criação de uma rede de segurança abrangente e de proteção social, entendido como um direito humano, bem como as políticas públicas que garantem formas de trabalho decentes.
6. Nesse sentido, reivindicamos a Plataforma para o Desenvolvimento das Américas (Plada) desenvolvida pela Confederação Sindical dos Trabalhadores da América (CSA), que contém, entre outras coisas, a medida e a maneira da transição justa que exigimos.
7. Essas ideias também pressupõem a expansão do conceito de trabalho, o reconhecimento do trabalho das mulheres e o equilíbrio entre a produção e reprodução, de modo a que esta não seja uma competência exclusiva das mulheres.
DA AMÉRICA LATINA NOS JUNTAMOS ÀS MOBILIZAÇÕES
Estamos apoiando o processo de trabalho e um novo ímpeto às manifestações da Coalizão francesa, que reúne vários grupos sociais e organiza atividades para nós, como pessoas do mundo, coloquemos nossas denúncias e exigências em Paris, e ao mesmo tempo, em muitas partes do planeta. Fazemos a partir do acumulo que mapeamos nas lutas e processos comuns, em momentos como a Conferência Mundial dos Povos sobre Mudança Climática e os Direitos da Mãe Terra em Cochabamba (Abril de 2010, e que teve sua segunda edição, de 9 a 12 de outubro), a Cúpula dos Povos Rio + 20 (Junho de 2012), o Pre Cop Social de Ilha Margarita (Novembro de 2014) e Cúpula dos Povos de Lima (Dezembro de 2014).
Neste caminho que estamos trilhando, chamamos para reforçar os laços de irmandade, solidariedade e de ação em processos destinados a construção de sociedades e coletividades justas, equitativas feiras, em que os direitos dos povos da nossa terra possam se respeitar.
Convocamos para aprofundar sobre as resistências locais, regionais e globais contra a implementação das soluções falsas e perigosas para as alterações climáticas, ao mesmo tempo que aumenta a promoção de soluções reais que já existem e provêm de pessoas.
Incitamos para apoiar as manifestações e a denúncia ativa do curso das negociações sobre o clima, que favorece as grandes corporações transnacionais e os governos dos países desenvolvidos.
Finalmente, chamamos para manifestar-nos em todos os espaços e territórios para apoiar as mais de duas semanas de manifestações de Paris 2015 (de 28 de novembro a 12 Dezembro). Entendemos que essa instância será um momento importante de convergência com organizações e movimentos sociais de diferentes regiões em um caminho mais longo pela justiça climática, que nos deve proporcionar para reunir forças e avançar em nossas lutas comuns.
SIGNATÁRIOS
- Confederação Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras das Américas (CSA)
- Coordenação Latino-Americana de Organizações do Campo (CLOC - Vía Campesina)
- Marcha Mundial das Mulheres (MMM)
- Jubileu Sul/Américas Grupo Carta de Belém Amigos da Terra América Latina e Caribe (ATALC)